Bem-vindo ao “colocar mais água no feijão” de todos que,
“comprometidos com a justiça social”, não se cansam de “trabalhar por um mundo
mais justo e solidário”
30/07/2013
Frei Betto
Bem-vindo aos nossos corações, nos quais gravou seu cativante
sorriso e a simplicidade tão rara naqueles que, como você, galgam os degraus do
poder.
Bem-vinda a sua ousadia evangélica de entrar no Brasil como
Jesus em Jerusalém: não montado no cavalo branco dos imperadores, equivalente
hoje às limusines blindadas, e sim no “burrico” de um carro de classe média, com
o vidro aberto, sem nojo do cheiro de povo nem temor da acolhida calorosa da
população.
Bem-vindo este nome, Francisco, para nomear um papa. O santo de
Assis rejeitou, nas origens do capitalismo, o sistema produtivo que gerava
concentração de riquezas e exclusão social, e que teve em Bernardone, pai do
jovem Francisco, um dos pioneiros.
Bem-vindo à opção pelos pobres, à denúncia da corrupção dentro
e fora da Igreja, e da “globalização da indiferença” diante dos fluxos
migratórios provocados pela miséria semeada na África pelo colonialismo
europeu.
Bem-vindo ao “colocar mais água no feijão” de todos que,
“comprometidos com a justiça social”, não se cansam de “trabalhar por um mundo
mais justo e solidário”.
Bem-vindo, Francisco, ao grêmio de todos que combatem a
“cultura do descartável” e, como você, acreditam que “a medida da grandeza de
uma sociedade é dada pelo modo como esta trata os mais necessitados, que não têm
outra coisa senão a sua pobreza.”
Bem-vindo à Igreja “advogada da justiça e defensora dos pobres
diante das intoleráveis desigualdades sociais e econômicas que clamam ao céu”,
como você enfatizou ao fazer eco ao Documento de Aparecida. Não mais uma Igreja
que, sob o pretexto de “não se meter em política”, se aninha à sombra dos ricos
e poderosos, cala a voz de seus profetas, prega a cruz de Jesus mas se recusa a
carregá-la por considerar difamações e perseguições uma maldição, e não uma
bem-aventurança.
Bem-vindo à reforma da Igreja iniciada pela mudança que você
imprime ao papado. Nada de arminho, cruz de ouro, sapatos vermelhos. “Acabou o
carnaval!”, você advertiu ao quererem vesti-lo como um príncipe. Nada de
tratá-lo por Sua Santidade, Sumo Pontífice, Santo Padre, e sim apenas por papa,
bispo de Roma, servo dos servos de Deus.
Bem-vindo, Francisco, à urgência de abrir os altares aos
sacerdotes casados e às mulheres vocacionadas ao sacerdócio; e os sacramentos
aos casais que contraíram segundas núpcias.
Bem-vindo às Comunidades Eclesiais de Base, que você tanto
valorizou em Aparecida, em 2007, ao fim do celibato obrigatório, à abertura do
debate sobre todos os temas atuais relacionados à teologia moral: preservativo,
homossexualismo, aborto, pílula do dia seguinte, célula-tronco etc.
Bem-vindo à reforma da Cúria Romana e à sua iniciativa de
nomear uma comissão de oito cardeais dos cinco continentes para assessorá-lo na
profilaxia da Igreja. Queira Deus que sejam extintos o Banco do Vaticano, e
também as nunciaturas apostólicas, de modo a valorizar, no espírito colegiado do
Vaticano II, as conferências episcopais.
Bem-vindo, Francisco, a esse mundo globocolonizado que tanto
necessita de um papa que seja expressão de Jesus e São Francisco: tolerante,
amigo dos pobres, misericordioso, alegre, servidor da justiça, capaz de
respeitar as diferenças religiosas e denunciar as causas das desigualdades
sociais.
Deus o conserve e Francisco de Assis o encoraje!
Frei Betto é escritor, autor de “Alfabetto –
autobiografia escolar” (Ática), entre outros livros. http://www.freibetto.org/>
twitter:@freibetto.
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